Writing the Infinite Poem, 2019
Writing the Infinite Poem, 2019.
Engraving ink, glue, crayon, oil, on burnt paper. 11mx0,30m.

Photos by Bruno Lopes, Travessa da Ermida, 2020

alunos da fbaul na ermida
prémio de pintura 1ª edição
2019-2020

Julho 2020
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um percurso sobre a pintura
contemplação e introspecção, imagem e palavra, representação e percepção

A exposição “alunos da fbaul na ermida – prémio de pintura” concretiza o desafio proposto aos alunos desta instituição na forma de um concurso aberto – a celebração da Pintura no séc. XXI, e da Arte enquanto actividade vital ao Homem. Perante todas as transformações que a História da Pintura encerra e, mais especificamente, as possibilidades conceptuais e técnicas abertas pelos vários movimentos nos últimos cento e cinquenta anos, pintar é perspectivado como um estimulante acto de coragem.
As propostas apresentadas denotam diversidade técnica e profundidade temática de grande vigor e irrequietude, um impulso criativo face à tradição tanto quanto a seriedade dignificante perante esta mesma, impregnando o processo de escolha por um oxímoro de empolgante pesar, em virtude da qualidade dos trabalhos propostos e da inevitável exclusão dos preteridos. A decisão recai sobre Bárbara Faden, João Motta Guedes e Madalena Hipólito, nos quais realçam-se as opções artísticas que, pela Arte, envolvem e cativam sensorialmente, e fazem sobressair e reflectir sobre problemáticas e anseios do Homem.(...)

Da mancha no fundo cromático, terrosa e embaciada como o solo de um lugar intemporal que se estende entre porvir e memória, ardida pelo instante e regenerada pela constante que acolhe, que a risca, que nela se inscreve, sobressai o gesto de João Motta Guedes. O seu desenho escrito, poema desenhado, não está desamparado de um código que torne o discurso discernível. Nesta gestualidade encontra-se a busca histórica pela conciliação quimérica entre a imagem e a palavra. A fraternidade entre as artes da imagem pictórica e literária consagrada por Simonides de Ceos, e, no escorrer do tempo, por Horácio, Da Vinci ou Van Gogh, é assinalada pelo poema infinito que João Motta Guedes pinta. Perante este, a retórica desloca-se da poiesis própria ao pintor e ao poeta para a arché necessidariamente universal ao artista, e à obra de arte.

João Motta Guedes invoca esta anterioridade do artista e da obra. Das convenções de forma, matéria, meio, e código. O porvir da criação é o impulso do artista sonhador em gerar e expressar, em declarar e questionar, em organizar e desalinhar. A obra encanta e perturba, surpreende e ilude, contamina e purifica. Primordiais na edificação, documentação e conservação do ser do ser-humano, enriquecem a vida. Elevam a realidade no mistério e na ilusão das metáforas e dos símbolos, e iluminam o invisível e o indizível. Tal como o poema infinito de João Motta Guedes, a intemporalidade desta arché alonga-se e dobra-se desde um ontem e perdurará em um amanhã, entre ambos escondendo-se e revelando-se nas curvas dos tempos e dos espaços vividos. (...)


Ricardo Escarduça